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terça-feira, dezembro 23, 2008

Bom Natal para todos


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As crianças viravam as folhas
dos dias enevoados
e da página do Natal
nasciam momentos prateados
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da infância. Intérmina, a mãe
fazia o bolo unido e quente
da noite na boca das crianças
acordadas de repente.
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Torres e ovelhas de barro
que do armário saíam
para formar a cidade
onde o menino nascia.
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Menino pronunciado
como uma palavra vagarosa
que terminava numa cruz
e começava numa rosa.
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Natal bordado por tias
que teciam com seus dedos
estradas que então havia
para a capital dos brinquedos.
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E as crianças com tinta invisível
do medo de serem futuro
escreviam seus pedidos
no muro que dava para o impossível,
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chão de estrelas onde dançavam
a sua louca identidade
de serem no dicionário
da dor futura: saudade.
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Natália Correia

domingo, dezembro 21, 2008

Tejo

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Manuel Faia
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Madrugada,
Descobre-me o rio
que atravesso tanto
para nada,
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E este encanto,
prende por um fio,
é a testemunha do que eu sei dizer.
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E a cidade,
chamam-lhe Lisboa,
mas é só o rio
que é verdade,
só o rio,
é a casa de água,
casa da cidade em que vim nascer.
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Tejo, meu doce Tejo, corres assim,
corres há milénios sem te arrepender,
és a casa da água onde há poucos anos eu escolhi nascer.
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Letra: Pedro Ayres de Magalhães
Música: José Peixoto
Interpretado: Madredeus

quarta-feira, dezembro 17, 2008

Pequenos deuses caseiros

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Remedios Varo
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Pequenos deuses caseiros
que brincais aos temporais,
passam-se os dias, semanas,
os meses e os anos
e vós jogais, jogais
o jogo dos tiranos.
o jogo dos tiranos.
o jogo dos tiranos.
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Pequenos deuses caseiros
cantai cantigas macias
tomai vossa morfina,
perdulai vossos dinheiros
derramai a vossa raiva
gozai vossas tiranias,
pequenos deuses caseiros.
pequenos deuses caseiros.
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Erguei vossos castelos
elegei vossos senhores
espancai vossos criados,
violai vossas criadas,
e bebei,
o vinho dos traidores
servido em taças roubadas
servido em taças roubadas
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Dormi em colchões de pena,
dançai dias inteiros,
comprai os que se vendem,
alteai vossas janelas,
e trancai as vossas portas,
pequenos deuses caseiros,
e reforçai, reforçai as sentinelas.
e reforçai, reforçai as sentinelas.
e reforçai, reforçai as sentinelas.
e reforçai, reforçai as sentinelas.
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Sidónio Muralha
cantado por Manuel Freire

terça-feira, dezembro 16, 2008

domingo, dezembro 14, 2008

caminhos...


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fios invisíveis
a aranha traça na teia
seu próprio caminho
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Jorge de Olinda (araraquara - 1985)

sábado, novembro 22, 2008

Nunca poderia durar...

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Pablo Picasso
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"... é impossível fundar uma civilização sobre
o medo, o ódio e a crueldade.
Nunca poderia durar."
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.George Orwell

quarta-feira, novembro 19, 2008

do esquecimento...

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Ana Pardo (árbol del olvido)
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Num verso cabe a vida e o seu olvido.
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.Luís Filipe de Castro Mendes

terça-feira, novembro 18, 2008

partir...

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Israel Zzepda
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a loucura de partir correndo,
pelo sonho dentro...
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.Teolinda Gersão

domingo, novembro 16, 2008

tanto faz...

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Picasso
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Pode-se pintar com óleo
com petróleo
ou aguarrás
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Mas pode-se também pintar com lágrimas
silenciosas
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No desprezo das horas odiosas
tanto faz

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Mário Dionísio

sábado, novembro 08, 2008

esperança...

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René Magritte
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neste espaço a si próprio condenado,
dum momento para o outro pode entrar
um pássaro que levante o céu
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Alexandre O'Neill

terça-feira, outubro 21, 2008

A mim quem me vence é o patrão

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René Magritte
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Ali está o rio
Dois homens na margem estão
Se um dá um passo o outro hesita
Será um valente? O outro não?
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Bom negócio faz um deles
Tem o triunfo na mão
Do outro lado do rio
Só um come o fruto, o outra não
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Ao outro passo o p'rigo
Novos castigos virão
Se ambos venceram o rio
Só um tubo ganha o outro não
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Na margem já conquistada
Só um venceu a valer
Perdeu o outro a saúde
Mas nada ganhou pra viver
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Quem diz "nós" saiba ver bem
Se diz a verdade ou não
Ambos vencemos o rio
A mim quem me vence é o patrão
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Bertolt Brecht
Cantado por Zeca Afonso

domingo, outubro 19, 2008

Desbaratamos deuses...

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Desbaratamos deuses, procurando
Um que nos satisfaça ou justifique.
Desbaratamos esperança, imaginando
Uma causa maior que nos explique.
Pensando nos secamos e perdemos…


Ary dos Santos

sexta-feira, abril 25, 2008

canção para a unidade

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(roubado por aí...)


Há tanto tempo que eu a esperava
Nas noites longas das discussões
Clandestinas, prolongadas, eternos serões

Há tanto tempo que eu ansiava por ir cantar para a rua
Garganta nua sem espada apontada
Tanto tempo antevi a discutir e desejei
Tanto tempo sofri por tudo o que não disse e não cantei

Chamava-se ela Liberdade, Revolta, eu sei lá
Talvez justiça ou simplesmente Igualdade
E era como uma gaivota solta da gaiola da cidade

E ei-la que chegou esperada e alegre
Numa madrugada triunfal
Durante uns tempos ´inda se chamou Revolução, hum!
E tinha a palavra aberta e a mão na mão, lembram-se?
Tinha a palavra aberta e a mão na mão

Depois teve nomes, baptismos e crismas
Foi, foi a transição para…
Foi, foi também como sabem… a via original
Surgiram os ventos, surgiram os cismas
Ventos de través, ventos de través na nau de Portugal

E que vejo eu?
É preciso voltar a combater pela verdade
É preciso voltar a perceber o que é a unidade

Quando um povo se ergue e pergunta como é?
Alguém vai tremer
É preciso é unir esse povo
E ousar lutar, ousar vencer
E lembrarmo-nos de novo
Que há tanta coisa para fazer

Pela unidade popular é preciso é juntar esse povo,
E ousar lutar, ousar vencer
E lembrarmo-nos de novo
Que há tanta coisa para fazer


Poema e música de Pedro Barroso

quinta-feira, abril 17, 2008

Demagogia

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Livia Alessandrini - Archeologia della mente
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Dão nas vistas em qualquer lugar
Jogando com as palavras como ninguém
Sabem como hão-de contornar
As mais directas perguntas
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Aproveitam todo o espaço
Que lhes oferecem na rádio e nos jornais
E falam com desembaraço
Como se fossem formados em falar demais
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Demagogia feita à maneira
É como queijo numa ratoeira
P’ra levar a água ao seu moinho

Têm nas mãos uma lata descomunal
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Prometem muito pão e vinho
Quando abre a caça eleitoral
Desde que se vêem no poleiro

São atacados de amnésia total
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Desde o último até ao primeiro
Vão-se curar em banquetes, numa social
Demagogia feita à maneira

É como queijo numa ratoeira


Letra e música de Luís Pedro Fonseca
Álbum Perto de ti, Lena d’Água 1982

segunda-feira, março 31, 2008

Há dias

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Castro Almeida
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Há dias em que julgamos
que todo o lixo do mundo
nos cai em cima
depois ao chegarmos à varanda avistamos
as crianças correndo no molhe
enquanto cantam
não lhes sei o nome
uma ou outra parece-me comigo
quero eu dizer:
com o que fui
quando cheguei a ser luminosa
presença da graça
ou da alegria
um sorriso abre-se então
num verão antigo
e dura
dura ainda.
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Eugénio de Andrade

sexta-feira, março 21, 2008

quem me roubou o tempo?

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Salvador Dali
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quem me roubou o tempo que era um
quem me roubou o tempo que era meu
o tempo todo inteiro que sorria
onde o meu eu foi mais limpo e verdadeiro
e onde por si mesmo se escrevia
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Sophia de Mello Breyner